FESTINOA,
Cielo Griselda. A Estética da Diferença
e o Ensino das Literaturas de Língua Inglesa. São Paulo: UNIP, 2014.
Sempre
se deve considerar o contexto de produção de uma narrativa literária,
especialmente daquelas de culturas distantes de nós em tempo e espaço, porque
nos ajuda a reconhecer a pluralidade da estética e suas diferentes
manifestações.
A
partir dessa perspectiva é relevante fazer uma leitura crítica do conceito do
literário, como um conceito definido localmente e, no panorama atual, em
contraponto com outras visões de literatura em outras partes do mundo.
A
estética evoca o que é universal, único, comum, homogêneo, natural,
desinteressado, idealista, metafísico (FREITAS CATON, 2002, p. 279), enquanto a
diferença aponta para o que é local, situado, contingente, múltiplo,
heterogêneo, considerado de uma determinada perspectiva comunitária.
A
ideia da estética como uma concepção única está associada com os valores
ocidentais, como sendo uma perspectiva verdadeira e genuína. Isso já vem
mostrar que a estética não é desinteressada, mas privilegia uma determinada
ideologia que tenta passar por universal.
A
visão universalista da estética é o resultado de uma relação sensorial
individual com o mundo, independente de tempo e lugar.
Quando
a estética é entendida como uma prática comunitária e diretamente relacionada
com a cultura em que é experimentada, percebe-se que culturas diversas têm
diferentes teorias estéticas, propõem metáforas literárias que têm marcas das
culturas em que são desenvolvidas e, por extensão, vão se relacionar com o que
é considerado como uma obra de arte de maneira diferenciada.
A
diferença pode ser entendida como um jogo (play) permanente entre forças
eruptivas e não disruptivas por meio das quais se geram as diferentes
identidades culturais.
A
diferença é sempre experimental e inovadora, multiplica-se em múltiplos
contextos e implica o amor das formas diferentes. É isso o que a estética da
diferença tem como objetivo: o amor do Outro por meio da apreciação de formas
diferentes.
É
a partir dessa estética da diferença que entendemos o conceito do literário não
como uma categoria universal, mas como culturalmente contingente: uma das
formas estéticas que, em conjunto com a imaginação, articula o que um povo
aprende da sua experiência: sabedoria, preconceitos, costumes, crenças,
práticas etc.
A
Literatura tem significado diferentes coisas para diferentes culturas através
dos séculos. Isso se deve a que cada cultura não só tem suas próprias
estratégias retóricas e estilos, mas também uma maneira diferenciada de
entender, por exemplo, conceitos como o amor, o que está longe de ser uma
categoria universal.
Se
no século dezoito o termo literatura era mais amplo, na primeira metade do século
dezenove, o Ocidente restringiu o conceito de literatura àquelas narrativas.
Foi essa ênfase no aspecto criativo da literatura que fez com o que o literário
fosse considerado uma classe de discurso puramente estético, desengajado
politicamente como a famosa frase da “arte pela arte mesma”.
Em
outras culturas, porém, os textos literários podem ter valor histórico ou
moral, além de qualquer consideração estética.
O
conteúdo estético e afetivo das narrativas literárias torna-se um canal
adequado para uma renovação da sociedade em geral e, no caso das literaturas
estrangeiras, torna-se um discurso mediador das relações entre diferentes
culturas.
Quando
interpretadas, como uma prática de conscientização, as narrativas literárias,
pelo plano estético, entram no plano cultural e levam à reflexão sobre o lócus
de enunciação do Outro e do Eu.
Dessa
maneira, pela leitura de textos literários, entendidos como construções
históricas e sociais que, por sua vez, não só afirmam, mas também interrogam a
história das diferentes culturas, passa-se a perceber o modo em que a própria
cultura se relaciona com outros locais e, por meio desse posicionamento
crítico, torna-se parte de um processo de mudança.
Falando
da educação em sentido lato, a aula de literatura em geral e a estrangeira em
particular tornam-se um terreno em que o aprendizado está intimamente ligado a
conceitos de lugar, identidade, história e poder, uma vez que permitem uma
reconsideração não só da leitura de textos produzidos em culturas tidas como
hegemônicas ou periféricas, mas também dos círculos de poder (acadêmicos,
políticos, editoriais etc.) que legitimam a leitura de determinados textos em
detrimento de outros.
Aspectos
sociais e estéticos se complementam: a leitura dos textos literários não se
reduz a aspectos culturais.
No
caso de uma literatura multicultural produzida em língua inglesa, em que o
professor se defronta com várias tradições literárias na sua sala de aula, isso
implica em se familiarizar com diferentes epistemologias estéticas e sistemas
culturais, para não reduzir os textos literários a narrativas sociais, ou
desqualificar sistemas artísticos, simplesmente porque eles não coincidem com
os nossos.
Nenhum comentário:
Postar um comentário